15 de junho de 2011

Marta e Maria

OS RELATOS DAS ESCRITURAS revelam o interior da alma humana, mas também apresentam um Deus que se manifesta a homens e mulheres como nós. Esse encontro e essa revelação de Deus sempre geram transformação. Assim, podemos ler a Bíblia e nos descobrir nas histórias que ela traz.

Lucas 10:38-42 registra a visita que Jesus Cristo fez a seus amigos Lázaro, Marta e Maria, em Betânia:

Caminhando Jesus e os seus discípulos, chegaram a um povoado, onde certa mulher chamada Marta o recebeu em sua casa. Maria, sua irmã, ficou sentada aos pés do Senhor, ouvindo a sua palavra. Marta, porém, estava ocupada com muito serviço. E, aproximando-se dele, perguntou: "Senhor, não te importas que minha irmã tenha me deixado sozinha com o serviço? Dize-lhe que me ajude!" Respondeu o Senhor: "Marta! Marta! Você está preocupada e inquieta com muitas coisas; todavia apenas uma é necessária. Maria escolheu a boa parte, e esta não lhe será tirada.

Podemos encarar esse relato como fato antigo e, assim, permanecermos distantes da Palavra, que faz sentido à nossa razão, mas não alcança o coração. Ou então, podemos nos identificar com Marta e Maria, recebendo a visita de Jesus Cristo e aprendendo com ele.


Somos parecidos com Marta: agitados, distraídos, dispersos, ocupados com muitas coisas, inquietos, ansiosos e preocupados. Marta está, como muitos, estressada. Ela serve constrangida; sua agenda cheia e rígida não lhe permite perceber essa oportunidade única. Está cheia de boas intenções, quer servir ao Mestre e receber bem seus convidados. Porém, fica dividida entre fazer o jantar e, ao mesmo tempo, estar na sala com o Senhor. Não demora muito até que se irrite com Maria, que simplesmente se senta aos pés de Cristo para ouvi-lo.

Buscamos o reconhecimento através do desempenho. Queremos servir e trabalhar, mas acabamos nos envolvendo com mais coisas do que realmente podemos dar conta. Surgem, então, comparações e reclamações. Começamos a achar que ninguém trabalha como nós, que carregamos o grupo ou a igreja nas costas. O trabalho, ainda que bem intencionado, torna-se fonte de insatisfação e irritação com os companheiros. Há muita gente assim na igreja. São irmãos e irmãs muito consagrados que produzem muito, mas tornaram-se rígidos, controladores e inflexíveis.

Maria escolheu parar. Não se tratava simplesmente de um tempo devocional com Cristo, mas de uma chance única, pois na época os rabinos não aceitavam mulheres assentadas "a seus pés", expressão que indica a aceitação de um discípulo por parte do mestre. Ela parou, separou o tempo necessário e ouviu com atenção.

Será que temos um tempo assim? Tempo de qualidade, de parar, desligar o telefone, para estar a sós com o Senhor e ouvi-lo com atenção? É isso que nos torna participantes do mistério da presença de Cristo em nós: ouvir e falar com ele na intimidade do coração, no recolhimento, na solirude, na quietude. Esse é o centro da vida cristã, a atividade interna do coração que se apega a Deus.

A partir disso, podemos nos mover às atividades externas, lidar com as dificuldades da vida e enfrentar todo tipo de conflito, luta, frustração, dor e tensão, pois sempre estaremos seguros pela doce e santa presença do Senhor no coração, pronto para nos acolher e se revelar.

Jesus Cristo se dirige a Marta, chamando-a pelo nome por duas vezes. Ele nos chama pelo nome quantas vezes for necessário até ter nossa atenção. Então, questiona sobre essa tirania do urgente que nos impede de ver o essencial. Em vez da correria e do perfeccionismo, que acabam por oprimir os que estão ao nosso redor, o Senhor nos chama a escolher uma única coisa, a mais importante, a mais preciosa. Ele não está interessado em desempenho, mas em nossa presença para que o ouçamos e amemos. Jesus Cristo busca o afeto de seus filhos, e não se impressiona com a perfàrmance. Seu amor incondicional nos liberta dessa identidade funcional.

Ora somos como Maria, desejosos de desfrutar da intimidade do Senhor e de permanecer a seus pés. Ora somos como Marta, agitados e envolvidos no ativismo frenético, insatisfeitos e irritadiços. Entretanto, em vez de polarizar as duas irmãs, podemos reconciliá-Ias. A disposição de Marta para o trabalho é louvável, pois alguém deve fazer o jantar; e Maria, por sua vez, não pode ficar para sempre aos pés de Jesus.

Há tempo de se recolher para orar e tempo para sair à luta no trabalho e no ministério. Há tempo de meditação e tempo de ação. Reconciliar as duas irmãs no coração significa trabalhar como Marta, mas com o afeto de Maria.

Reprodução do texto "Marta e Maria", entre as páginas 53 e 55 do livro Meditatio, de Osmar Ludovico. Mais uma vez recomendo a compra do livro, é excelente! O texto foi reproduzido na íntegra e sem alterações. A reprodução do mesmo aqui não tem a intenção de lesar o autor ou propagar conteúdo copiado de forma ilícita, mas se trata meramente de uma homenagem e reconhecimento a um belo texto.

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